A origem da feijoada não está nas senzalas
A origem da feijoada é cercada por mitos. Um dos mais populares diz que o prato nasceu nas senzalas, preparado por pessoas escravizadas com as sobras do porco rejeitadas pelos senhores. No entanto, essa narrativa não se sustenta historicamente.
Pesquisas e registros mostram que a feijoada tem raízes bem diferentes — e muito mais ligadas à tradição culinária europeia do que se imagina.
Feijoada: uma herança do cozido europeu
A feijoada como conhecemos hoje tem dois ingredientes principais: feijão preto e carne de porco. O feijão preto é nativo da América do Sul, mas a tradição de preparar guisados com carnes e legumes vem da Europa. Pratos como o cassoulet francês, o cozido português e o bollito misto italiano são exemplos de antecessores.
Foi com os portugueses que essa tradição chegou ao Brasil. Com o tempo, o cozido europeu foi adaptado ao paladar local, utilizando ingredientes como o feijão-preto e partes variadas do porco, amplamente consumidas tanto por ricos quanto por pobres na Europa.
Os escravizados e a alimentação real
Durante o período colonial, a alimentação dos escravizados era baseada em pratos simples como angu de milho, feijão e carne seca. Relatos da época indicam que a dieta era pobre e variava conforme a região e a fazenda. Não há registros confiáveis que comprovem a criação da feijoada nas senzalas.
Além disso, muitos escravizados tinham origem muçulmana ou seguiam tradições que proibiam o consumo de carne de porco, o que torna ainda mais improvável essa associação direta com a criação do prato.
A feijoada e a elite do século XIX
Os primeiros registros da feijoada surgem em ambientes frequentados pela elite urbana do século XIX. Em 1833, o Hotel Théâtre, em Recife, anunciou que às quintas-feiras serviria “feijoada à brasileira”. Desde então, o prato passou a fazer parte do cardápio de restaurantes refinados e conquistou espaço na cultura gastronômica do país.
O historiador Câmara Cascudo descreve a feijoada como um exemplo de “aculturação culinária”, resultado da mistura de práticas europeias com ingredientes brasileiros, como a carne seca do sertão, o charque do Sul e a couve.
O papel das mãos negras
Mesmo que a origem da feijoada esteja ligada à Europa, é importante reconhecer o papel fundamental das mulheres negras escravizadas na execução e preservação da receita. Eram elas as responsáveis por preparar os alimentos das casas senhoriais, já que, com a massiva quantidade de escravos advindos da África e a grande quantidade de mão de obra ‘gratuita’, era uma desonra um homem livre trabalhar”, afirma o bacharel em Gastronomia Lucas Melo Melquiades da Silva em seu trabalho de conclusão de curso, nomeado “Gastronomia Afro-Brasileira: Compreendendo A Origem, Histórias E Estórias Da Feijoada“.
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